Arbitragem na construção civil é caminho sem volta

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No dia 15 de setembro, o Conselho Nacional de Justiça divulgou seu documento anual com as estatísticas das diversas instâncias do Judiciário brasileiro referentes a 2014, denominado Justiça em Números, confirmando que, no ano passado, foram movimentados mais de 100 milhões de processos, o que demonstra a crescente demanda da população pelo acesso à Justiça.
Nesse cenário, diversas vozes importantes invocam a necessidade de uma correção de rumo, devendo a sociedade buscar outros meios para solução dos conflitos, como o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, ao afirmar que “há necessidade de se debelar a cultura ‘judicialista’ que se estabeleceu fortemente no país, segundo a qual todas as questões precisam passar pelo crivo do Judiciário para ser resolvidas”, e também Marcus Vinícius Furtado Coêlho, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), conclamando que “é preciso uma mudança cultural, encerrando a era do litígio e fazendo aposta na conciliação, mediação e arbitragem”.
Muitos são os fatores que explicam o aumento da litigiosidade no Brasil, entre os quais se destacam a insegurança jurídica, decorrente do excesso de leis, a aplicação bem sucedida do Código de Defesa do Consumidor, aliada à privatização de serviços e à concentração bancária e comercial, o aumento do salário mínimo e programas de transferência de renda, posteriores à estabilização da moeda, que inseriram milhões de pessoas no mercado do consumo.
Embora exista um consenso quanto à questão cultural enraizada na sociedade brasileira, que de forma inercial busca o Poder Judiciário, em alguns setores cresce a consciência quanto à importância de aplicar os denominados Mecanismos Extrajudiciais de Soluções de Conflitos (MESCs), tais como o mercado imobiliário e da construção, setores onde uma pesquisa do ano de 2002 mostrou que 48% dos contratos geraram disputas, entretanto, 50% delas terminaram em acordo.
Entre essas modalidades destaca-se a arbitragem, meio de solução de controvérsias em que as partes escolhem uma pessoa imparcial, da confiança recíproca, podendo ser um especialista na matéria, para decidir a questão, cuja sentença, respaldada pela Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), originalmente disciplinando a matéria, e mais recentemente sua reforma (Lei 13.129/15), que incluiu novos dispositivos ao primitivo diploma legal, tem valor equivalente àquela emitida no Poder Judiciário, encerrando definitivamente a disputa.
Esses casos são usualmente processados em órgãos próprios, conhecidos como câmaras arbitrais, cujas estatísticas revelam que o mercado imobiliário e o setor da construção, nas suas diversas variações, respondem por mais de metade dos procedimentos, o que decorre de contratos de elevada complexidade, pois regulam os mais variados aspectos, à gama de participantes, a multiplicidade de fatos, as questões técnicas e particulares, o trato sucessivo, pois sua satisfação não ocorre em um só momento e são de duração extensiva, e por não conseguirem abranger todas as ocorrências e contingências.
Como os conflitos nesses setores envolvem normalmente grande quantidade de eventos, enquanto nosso sistema processual tem regras rígidas, muitas são as situações em que a arbitragem oferece flexibilidade nos procedimentos e a possibilidade de participação de especialistas no julgamento, como nos casos que apresentaremos a seguir, contendo uma série de situações em que presenciamos a utilização desse instituto.
Começamos por um caso de erro de projeto na construção de uma arena multiúso, em que o árbitro analisou as soluções técnicas viáveis, ou no encerramento de uma obra, tanto construção como reforma, cuja arbitragem promoveu o acerto de contas, bem como em divergências decorrentes de incorporação imobiliária, envolvendo os cálculos das áreas e o rateio das despesas, assim como na compra e venda de imóveis na planta, que envolvem a falta de pagamento ou o atraso na obra.
O mais comum nas obras de infraestrutura ou construção pesada refere-se ao surgimento de pleitos, onde a arbitragem oferece a celeridade para a definição clara dos pedidos, assim como pode ser utilizada em casos de locação corporativa, colapso de estruturas, disputa sobre a propriedade de imóveis, inadimplência condominial, partilha de bens e tantas outras situações.
Este é, sem dúvida, um caminho sem volta, pois a sociedade já percebeu as grandes vantagens da utilização desse instituto como instrumento de pacificação social, e não estamos falando de algo novo, pois no 3ª Festival de História, ocorrido neste mês de outubro, em Minas Gerais, foi apresentado um trabalho que relata a solução de conflitos entre mineradores e garimpeiros nas cidades de Diamantina e Serro, que ocorreu durante o século XIX.
Por Francisco Maia Neto, secretário-geral da Comissão de Mediação e Arbitragem do Conselho Federal da OAB e presidente da Comissão de Direito da Construção da OAB-MG.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 20 de outubro de 2015, 9h04

Extinção da instituição arbitral eleita na cláusula compromissória e a subsistência da jurisdição privada

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A escolha, pelas partes contratantes, da instituição responsável pela administração de possível arbitragem é de suma relevância, eis que importa na imediata adesão ao regulamento do órgão eleito, cujas regras serão aplicadas ao futuro processo arbitral.
Tais regras – na ausência de estipulação em contrário – definem, por exemplo, o procedimento de nomeação dos árbitros, toda a sistemática de formação do tribunal arbitral, a produção de provas, entre diversas outras questões procedimentais relacionadas à arbitragem que será administrada pela instituição.
Ainda que a definição da câmara arbitral seja importante, contudo, a opção em si pela arbitragem como método de solução de conflitos, geralmente, não tem por premissa a identidade figura da instituição eleita. Não é comum se deparar com uma situação em que as partes contratantes optaram pela arbitragem apenas por conta da confiança depositada em determinada instituição arbitral – que, lembre-se, não tem por missão julgar o mérito do litígio, mas apenas administrar o procedimento.
Foi com fundamento nesse entendimento que o TJ/SP, em recente acórdão1, reformando decisão de 1ª instância, não considerou decisivo o fato de ter deixado de existir a câmara arbitral eleita pelas partes, razão pela qual acolheu a preliminar de arbitragem suscitada pela ré e extinguiu o processo judicial.
Tendo, de um lado, observado que a vontade manifestada pelas partes foi no sentido de submeter qualquer disputa à jurisdição privada e, de outro lado, considerado que o órgão eleito para administração de eventuais procedimentos arbitrais deixou de existir, o voto condutor tratou, então, de investigar se a convenção de arbitragem foi pactuada pela simples intenção de excluir o juízo estatal ou se foi prevista com fundamento exclusivamente relacionado às características da instituição eleita, não se aceitando qualquer outra em substituição.
Concluiu o relator, acompanhado por unanimidade, que, não tendo sido expressamente convencionada na cláusula compromissória a vedação à substituição do órgão arbitral inicialmente eleito, deveria prevalecer a intenção das partes de afastar a jurisdição estatal, aplicando ao caso concreto, por analogia, a regra disposta no artigo 16, § 2º, da lei 9.307/96, segundo a qual “nada dispondo a convenção de arbitragem e não chegando as partes a um acordo sobre a nomeação do árbitro a ser substituído [em caso de falecimento, recusa ou outra impossibilidade do árbitro originalmente indicado], procederá a parte interessada da forma prevista no art. 7º desta Lei, a menos que as partes tenham declarado, expressamente, na convenção de arbitragem, não aceitar substituto”.
O precedente ora comentado demonstrou cautela ao analisar a questão, tendo, ao fim, prestigiado tanto a jurisdição arbitral, como a vontade das partes, restando estabelecido que, nesses casos, deve ser sempre perquirida sua real intenção.
Desse modo, considerando o posicionamento externado pelo TJ/SP no caso, revela-se pertinente que as partes, na hipótese de só aceitarem se sujeitar à arbitragem administrada por determinada instituição arbitral (em razão de certas especificidades ou até mesmo por questões de confiança), consignem expressamente tal vontade na cláusula compromissória, vedando a substituição da instituição eleita e/ou de suas regras.
1 TJSP, Agravo de Instrumento 2204194-40.2014.8.26.0000, Relator Des. Carlos Henrique Miguel Trevisan, 29ª Câmara de Direito Privado, j. em 11.3.15. No mesmo sentido: TJSP, Apelação 0019267-08.2012.8.26.0011, 33ª Câmara de Direito Privado, 1.9.14.
Por Daniel Ponte, sócio do escritório Lobo & Ibeas Advogados e Luisa Coelho, associada do escritório Lobo & Ibeas Advogados.
Fonte: Migalhas segunda-feira, 19 de outubro de 2015

O financiamento de arbitragens por terceiros como garantia de acesso à Justiça

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A arbitragem nunca teve tanto destaque no Brasil. O (bom) uso do instituto nos dezenove anos de vigência da lei Federal 9.307/96 (a chamada Lei de Arbitragem), aliado ao seu reconhecimento por reiterada jurisprudência dos Tribunais Superiores, sedimentaram-no como excepcional mecanismo de solução de controvérsias. O ano de 2015 é um ano especial, não só pela reforma da Lei de Arbitragem, que atualizou e modernizou o instituto, mas pela edição do Novo Código de Processo Civil, que incentiva a utilização da arbitragem e cria mecanismos para que o Judiciário a assegure como método legítimo de resolução dos conflitos.
No entanto, em momentos de baixa liquidez, os custos da arbitragem, geralmente mais elevados que os das demandas travadas perante o Poder Judiciário, podem desencorajar as empresas a fazer uso do instituto, ou postergar a solução de demandas. Algumas saídas podem ser oferecidas nessa hipótese, e uma das mais controversas, mas mais eficientes, é o financiamento da disputa arbitral por terceiros.
O suporte financeiro de litígios por terceiros é historicamente criticado em alguns países e culturas. Na Roma Antiga, quem prestava apoio a litígios poderia responder por calúnia, embora a prática não fosse inteiramente proibida. No Reino Unido, por sua vez, o financiamento de disputas poderia ser enquadrado em não apenas um, mas três ilícitos distintos, proibindo de diferentes formas o suporte a litígio conduzido por outra pessoa. As razões da proibição remontam ao período do rompimento com o feudalismo, representado pela Magna Carta, que neste ano comemora oito séculos da sua promulgação. Como retaliação contra a perda de poderes sinalizada nas mudanças do fim da Idade Média, os nobres comumente incitavam e financiavam terceiros a demandas sem fundamento, como uma forma de intimidar seus oponentes e juízes. Nesse contexto, a proibição ao financiamento de litígios por terceiros constituía um instrumento para garantir direitos na democracia que então alvorecia.
Com o passar do tempo, e estabelecido um novo paradigma para a sociedade, o tratamento do financiamento de disputas sofreu uma guinada no direito inglês, e sob o mesmo raciocínio que o tornou proibido anos antes: a garantia de direitos. Sua importância como uma forma de assegurar o acesso à justiça foi tema de discurso proferido em 2013 pelo atual Presidente da Suprema Corte do Reino Unido, Lord David Neuberger, intitulado From barretry, maintenance and champerty to litigation funding, em palestra perante uma das mais conceituadas instituições de financiamento de disputas arbitrais e jurisdicionais da Inglaterra1.
No Brasil, não há proibição expressa à cessão de direito discutido em processo a terceiro, mediante contrapartida em dinheiro, que pode ser investida no custeio da disputa. Contudo, o financiamento de arbitragens por terceiros não passaria apenas pelo simples crivo de ser possível ou não, sendo diversas as preocupações que mais se relacionam à arbitragem do que ao financiamento em si. Essas preocupações estão diretamente relacionadas aos princípios basilares da arbitragem, positivados no art. 21, § 1º, da Lei, quais sejam, os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.
Desta feita, tem-se por primeiro e mais importante que o financiador não deve comprometer de forma alguma a imparcialidade do árbitro. Por consequência, o financiamento e o financiador devem ser revelados às partes e ao Tribunal Arbitral, a qualquer momento em que celebrado o contrato de financiamento, seja antes da instauração ou no decorrer do procedimento, ainda que exista cláusula de confidencialidade no contrato. Da mesma forma, os árbitros se obrigam a revelar qualquer informação relevante a respeito do financiador, em cumprimento do seu dever de imparcialidade e garantindo a igualdade das partes.
Por outro lado, a contratação do financiamento pode representar quebra do dever de confidencialidade existente no contrato submetido à arbitragem e no procedimento. É natural que o financiador queira se informar de forma qualificada sobre o litígio, a fim de decidir se fará o aporte ou não. Mais que isso, é também razoável que o financiador pretenda receber informações no decorrer do procedimento, seja como uma forma de acompanhar eventual retorno do seu investimento, seja para compreender despesas incorridas no curso da arbitragem (taxas de administração de câmaras e honorários de árbitros complementares, honorários periciais, etc).
Questão diretamente atrelada à circulação de informações do procedimento arbitral é a possibilidade de interferência do financiador na estratégia da arbitragem ou mesmo na escolha do advogado do financiado. Além disso, questiona-se se o financiador se responsabilizará somente pelo pagamento das despesas da parte por ele financiada, ou se também deverá arcar com o reembolso dos valores despendidos pela outra parte na hipótese de insucesso da demanda por ela apoiada (e caso seja possível o reembolso).
Evidente que muitas dessas questões receberão diferentes enfoques, caso a caso, mas, em noções introdutórias, já é possível entrever possíveis impasses em diferentes matérias. Cabe lembrar que o recurso ao financiamento de arbitragens é medida positiva e eficaz para realizar direitos e garantir acesso à justiça, devendo as partes ter sempre em mente que a opção pelo financiamento não poderá dificultar ou inviabilizar a arbitragem.
Em alguns países, especialmente no Reino Unido, nos Estados Unidos e na Austrália, o financiamento de processos e de arbitragens criou um mercado próprio, que movimenta milhões de dólares por ano. Nesses Estados, foi necessário superar a barreira da ilegalidade para que o financiamento de arbitragens se firmasse como negócio rentável. Nosso caminho é mais curto, mas algumas questões devem ser resolvidas para que, com segurança, o financiamento de disputas por terceiros engrandeça a arbitragem no Brasil.
Harbour Litigation Funding First Annual Lecture, clique aqui
Por Pedro Augusto de Castro Freitas, advogado do escritório GVM – Guimarães & Vieira de Mello Advogados.
Fonte: Migalhas, sexta-feira, 16 de outubro de 2015

A arbitragem de emergência como alternativa para solução de medidas urgentes na jurisdição privada

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É relativamente comum que as partes signatárias de convenção de arbitragem se deparem com a necessidade de solicitação de medidas urgentes, de natureza cautelar, antes mesmo da constituição do Tribunal Arbitral.
Nessa hipótese, as partes habitualmente direcionam suas pretensões urgentes ao Poder Judiciário. No entanto, há outra conduta possível, para aqueles que não tenham interesse em submeter qualquer etapa de suas disputas ao Judiciário, já que optaram pela jurisdição privada.
Com efeito, algumas câmaras arbitrais (nacionais e internacionais) preveem, em seus regulamentos, a possibilidade de nomeação de “árbitro de emergência” (ou “árbitro de apoio”), para apreciar medidas urgentes.
O Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), por exemplo, estabelece procedimento específico para a nomeação, impugnação e atuação de árbitro de emergência (emergency arbitrator),1 possível antes da transmissão dos autos ao Tribunal Arbitral (ato que formaliza a constituição do Tribunal2). De acordo com o Regulamento da CCI, a decisão do árbitro de emergência terá a natureza de ordem processual, devendo ser proferida em até 15 dias, sem que tal decisão vincule em qualquer medida o Tribunal Arbitral posteriormente constituído (que poderá alterar, revogar ou anular a ordem3).
No plano nacional, exemplo de instituição a tratar da apreciação de medidas urgentes na jurisdição privada antes da formação do Tribunal Arbitral é a Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM), que faculta às partes o requerimento de nomeação de árbitro de apoio, para decisão sobre “medidas conservatórias ou reparatórias revestidas de caráter de urgência, a fim de prevenir dano iminente ou prejuízo irreparável”. O Regulamento da CAM, contudo, apenas autoriza a nomeação de árbitro de apoio se a convenção de arbitragem contiver previsão expressa a esse respeito.4
De fato, a arbitragem de emergência tem se transformado em importante mecanismo de solução de medidas urgentes no âmbito da jurisdição privada, projetando para tal procedimento os mesmos atrativos da arbitragem em geral, tais como a rápida apreciação da questão (em contraposição à morosidade da jurisdição estatal, comum mesmo em casos de medidas liminares), a especialização do árbitro (ainda que, segundo os regulamentos acima citados, caiba ao presidente da câmara arbitral – e não às partes – nomear árbitro de emergência, dentre os que compõem os quadros da instituição) e a confidencialidade.
No entanto, a doutrina especializada tem apontado como um dos principais inconvenientes da adoção da arbitragem de emergência, no âmbito de arbitragens internacionais, a insegurança quanto à possibilidade de homologação e execução das ordens proferidas em tais procedimentos. Um dos principais argumentos invocados para questionar a executoriedade de tais decisões é o de que, por não terem natureza de sentença arbitral (não sendo, portanto, decisões definitivas), a elas não seriam aplicáveis, ao menos em tese, as disposições da Convenção de Nova York.5
De todo modo, a depender dos interesses das partes, a utilização do árbitro de emergência pode ser benéfica, sobretudo em arbitragens domésticas, para dirimir medidas urgentes, sendo conveniente que as partes interessadas em se valer de tal mecanismo expressem a sua vontade por ocasião da convenção de arbitragem, e, claro, conheçam de antemão como a câmara de arbitragem eleita regula o assunto.
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1 Vide Regulamento de Arbitragem da CCI – art. 29 (“árbitro de emergência”) e Apêndice V (“regras sobre o árbitro de emergência”). Por força do art. 29 (5), tais dispositivos somente são aplicáveis às partes signatárias da convenção de arbitragem (ou seus sucessores), quando esta preveja a aplicação do Regulamento da CCI e tenha sido invocada para o requerimento da medida urgente, ficando afastada a sua aplicação quando (i) a convenção seja anterior à data da entrada em vigor do Regulamento atual ou (ii) quando as partes tiverem convencionado excluir a sua incidência ou adotar outro procedimento pré-arbitral para solução de medidas urgentes: clique aqui.
2 E, portanto, nos termos do art. 19 da Lei 9.307/96, a instituição da arbitragem.
3 Não só por previsão expressa do Regulamento de Arbitragem da CCI, mas também porque, como esclarecem C.A. da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, tendo a medida sido concedida “anteriormente à instauração da arbitragem, mediante, portanto, cognição sumária, (…) salta aos olhos o acerto de o árbitro, após examinar as razões das partes e sopesar a prova produzida, agindo por força de lei com a mesma diligência exigida do magistrado, manifestar-se em definitivo sobre a matéria.” (In: Arbitragem interna e internacional: questões de doutrina e da prática. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 256)
4 Vide Regulamento da CAM – art. 5.1 (“medidas de urgência antes de constituído o Tribunal Arbitral”): clique aqui.
5 Nesse sentido: clique aqui. No Brasil, Embora a questão ainda não tenha sido apreciada pelo STJ, há precedente do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem anteriormente cabia a homologação de sentenças estrangeiras, no sentido de que decisões cautelares devem ser equiparadas a sentenças, para fins de homologação e cumprimento no território nacional (AgRg em CR nº 7.613-4, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 03.04.97). Para maiores informações, vide artigo “O cumprimento no Brasil de medidas cautelares concedidas no âmbito de procedimento arbitral estrangeiro”, que integra esta edição do Informativo.
Por Marcelo Levitinas e Renato Ferreira, respectivamente, sócio e associado do escritório Lobo & Ibeas Advogados.
Fonte: Migalhas, sexta-feira, 9 de outubro de 2015

 

É possível incluir na jurisdição arbitral partes que não assinaram contrato gerador do litígio

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A 1ª câmara Reservada de Direito Empresarial do TJ/SP julgou improcedente pedido das empresas GP Partners e Smiles para que sentença arbitral contra elas fosse anulada, uma vez que não firmaram o contrato gerador do litígio. De acordo com o colegiado, é possível, em situações excepcionais como a dos autos, incluir no âmbito da jurisdição arbitral partes que não assinaram o contrato no qual foi redigida a cláusula, porque prestaram garantia plena e ostensivamente assumiram a titularidade da negociação.
Os desembargadores também entenderam que a sentença arbitral atendeu aos princípios da instrumentalidade, eficiência e economia processual, “em linha com a processualística contemporânea que prioriza resultados justos e efetivos”.
O contrato que gerou o litígio foi o seguinte: os controladores da Imbra cederam as ações do bloco de controle à Almeria, estipulando-se expressamente, no respectivo contrato, a cláusula compromissória. Almeria, adquirente das ações do controle da Imbra, por sua vez, era controlada pela empresa Baladare, interveniente no contrato. Esta última era controlada pela empresa Smiles, sendo esta, por seu turno, controlada pela Gp Capital Partners.
A ação com pedido de anulação de sentença arbitral foi julgada improcedente pelo juiz de Direito Paulo Furtado de Oliveira Filho, da 2ª vara de Falências e Recuperações Judiciais. Na ocasião, o magistrado considerou que a anuência da apelante com a cláusula arbitral foi reconhecida pela análise dos elementos probatórios carreados aos autos e que evidenciaram como foram feitas as negociações do contrato empresarial. Segundo ele, “os executivos da GP negociaram os termos do contrato com os réus, depois de adquirido o controle assumiram a direção da operação comercial, e, por fim, negociaram a alienação do controle para a Arbeit”. O magistrado concluiu ainda que “a compreensão da realidade empresarial, como decidido na sentença arbitral, o GP foi o verdadeiro contratante, sujeitando-se à cláusula compromissória”.
Na apelação ao TJ, as empresas alegaram que o procedimento arbitral se deu contra “expressa vontade, sem que jamais tivessem firmado cláusula arbitral alguma”. As apelantes argumentaram também que não são signatárias do contrato de compra e venda de ações e seus aditivos, ou mesmo do acordo de acionistas da Imbra. Aduziram ser inadmissível a extensão a elas da “cláusula compromissória pelo simples fato de serem sócias e compartilharem alguns administradores com a Almeria.”
O relator do caso no Tribunal, desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, ressaltou que a vinculação pode ser reconhecida em razão das circunstâncias negociais. De acordo com ele, verifica-se que a GP foi a verdadeira contratante e capitaneou as negociações que resultaram na alienação das ações dos controladores, que conferiam o poder de controle da Imbra, com o que o controle da companhia foi transferido para a Almeria.
Segundo Pereira Calças, diante de tais fatos, em rigor, sequer há necessidade de se invocar a teoria da extensão da cláusula compromissória a não signatário, haja vista que, ao dominar as negociações e ulteriores operações empresariais relacionadas com a Imbra, a apelante GP, “inegavelmente, consentiu com a cláusula compromissória pactuada no contrato escrito, cujo instrumento não firmou”.
De acordo com a decisão, a sentença arbitral não ofende o princípio da adstrição ou congruência. A pretensão deduzida pelos requerentes da arbitragem era de indenização, de forma ampla, dos prejuízos sofridos em decorrência de execuções contra eles movidas. De acordo com o desembargador Pereira Calças, a solução dada pela sentença arbitral de determinar aos requeridos a realização de depósitos judiciais para garantia dos juízos das execuções atinge a finalidade pretendida e “atende aos princípios da instrumentalidade, eficiência e economia processual, em linha com a processualística contemporânea que prioriza resultados justos e efetivos”. “O depósito feito diretamente pelos requeridos como garantia dos juízos das execuções é mais eficiente do que a satisfação das execuções pelos requerentes da arbitragem e posterior ressarcimento a eles pelas requeridas, e o efeito econômico para estas últimas é o mesmo.”
O desembargador Ênio Santarelli Zuliani pontuou que a submissão das autoras ao julgamento arbitral não resulta da incidência da teoria da desconsideração da personalidade jurídica prevista no art. 50 do CC, mas decorre de um articulado desenhado a partir da denúncia de relação de fato encoberta no contrato e escancarada de forma pública e ostentiva quando a transferência das ações da Imbra surtiu o seu maior efeito. “Os fatos subsequentes evidenciaram que a negociação foi em benefício próprio das autoras e não pela linha de atividade (investimentos sem integração societária).”
Para Zuliani, “se fosse permitido falar que houve desconsideração atípica ou excepcional, ela surgiu apropriada para dar transparência aos fatos e não inibir a atuação judicial diante da apertada regra da individualidade de patrimônios”. O desembargador pontuou ainda que a sentença não padece de vícios estruturais e deve ser mantida para que produza seus efeitos jurídicos e financeiros. “O montante dos honorários comportava redução, tal como sugerido no voto condutor”. Também participou do julgamento o desembargador Francisco Loureiro.
Honorários
O colegiado reformou a sentença do juízo de 1º grau apenas no que se refere ao valor arbitrado a título de honorários de sucumbência em favor dos coapelados. “A fixação em 10% do valor da causa (que equivaleria, em maio de 2013, a R$ 6.258.471,76), realmente se revela exagerada e desproporcional. Por tal razão, e considerando os montantes arbitrados em favor dos patronos dos outros corréus R$ 100.000,00 (cem mil reais) para ARBEIT E BALADARE e R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para a massa falida da IMBRA, considerados razoáveis pelas apelantes bem como o maior envolvimento dos coapelados na causa, fica reduzida tal verba para R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), no que se observa o art. 20, § 4º, do CPC”.
Processo: 0035404-55.2013.8.26.0100
Veja a íntegra da decisão.
Fonte: Migalhas, quarta-feira, 7 de outubro de 2015

As possibilidades de arbitragem em contratos administrativos

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A Lei 13.129, de 26.5.15, ao alterar a lei de arbitragem (Lei 9.307, de 23.9.96), pôs fim à controvérsia a respeito da possibilidade ou não de utilização de arbitragem pela administração pública. No parágrafo 1º do artigo 1º, estabelece que “a administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. Antes disso, algumas leis já previam o uso de mecanismos privados de resolução de disputas, suprindo a omissão da Lei 8.666/93. É o caso do artigo 23-A da Lei 8.987/95, do artigo 11, III, Lei 11.079/04, além de normas contidas nas leis sobre telecomunicações, transportes aquaviários e terrestres, energia elétrica, dentre outras.
A Lei 9.307 não autorizou nem proibiu o emprego da arbitragem pela administração pública, mas o seu artigo 1º é bastante genérico ao estabelecer que “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. Este último requisito gerou controvérsias sobre a possibilidade ou não de uso de arbitragem pela administração pública.
A Lei 13.129/15 resolveu a controvérsia quanto ao cabimento ou não de cláusula compromissória nos contratos administrativos em geral, mas deixou em aberto a dúvida quanto ao alcance da expressão “direitos patrimoniais disponíveis”. Muitos critérios têm sido apontados pela doutrina e jurisprudência para indicar as hipóteses de cabimento da arbitragem pela administração: é possível usar a arbitragem quando se trata de (i) ato de gestão, (ii) em relação aos serviços comerciais e industriais do Estado, (iii) nos atos negociais, em que a administração se iguala ao particular, porque age sem prerrogativas públicas, (iv) nos contratos de direito privado, (v) nas empresas estatais que exercem atividade econômica com base no artigo 173, parágrafo 1º, da Constituição.
Na realidade, todos os critérios são válidos. Uns não excluem os outros. No entanto, alguns aspectos são especialmente relevantes, a começar pela análise dos vocábulos “patrimônio” e “disponível”.
O vocábulo “patrimônio”, no Direito Administrativo, tem sentido bastante amplo, abrangendo o patrimônio econômico, o moral, o cultural, o histórico, o paisagístico, o artístico, o arqueológico, dentre outros. Mas, para fins de interpretação da expressão “direitos patrimoniais disponíveis”, o que interessa é o aspecto econômico. Na definição de Clóvis Beviláqua, patrimônio é o “complexo das relações jurídicas de uma pessoa, que tiverem valor econômico”.
Segundo o autor, incluem-se no patrimônio: a posse, os direitos reais, os direitos obrigacionais, as relações econômicas do Direito de Família, as ações correspondentes a esses direitos. E excluem-se do patrimônio os direitos individuais à existência, à honra e à liberdade, os direitos pessoais entre os cônjuges, os direitos de autoridade entre pai e filho, os direitos políticos.
No âmbito do Direito Público, também existem direitos que admitem valoração econômica e outros que não a admitem. Por exemplo: é possível dizer que determinadas atividades exercidas pelo Estado são passíveis de valoração econômica (são as atividades econômicas por ele exercidas direta ou indiretamente). Outras não admitem essa valoração, como determinados serviços sociais do Estado, que correspondem aos direitos sociais do homem, considerados como direitos fundamentais.
O antigo Regulamento do Código de Contabilidade da União (Decreto 15.783, de 8.11.1922) ao tratar dos bens públicos, chamava os bens de uso especial de patrimoniais indisponíveis, porque, embora passíveis de avaliação econômica, têm uma destinação pública que os torna indisponíveis; os bens dominicais eram chamados de patrimoniais disponíveis, porque, além de serem passíveis de valoração econômica, não têm uma destinação pública que justifique a indisponibilidade. As duas primeiras categorias são res extra commercium: estão fora do comércio jurídico de Direito Privado. Portanto, não podem ser objeto de nenhuma relação jurídica regida pelo Direito Privado, como é o caso do compromisso arbitral e da transação.
Também é preciso tomar cuidado com o vocábulo “disponível”. Ele pode dar a errônea impressão de que significa livre disposição, liberalidade, mas não é esse o sentido correto. Quando se diz que os bens dominicais são disponíveis, é apenas no sentido de que eles podem ser objeto de negociação pelo poder público, por meio de institutos regidos pelo Direito Privado, como compra e venda, locação, permuta, doação. Isto porque, enquanto não têm destinação pública, são passíveis de valoração econômica.
À primeira vista, é chocante aceitar que possam existir, com relação ao patrimônio público, direitos patrimoniais disponíveis. A tendência é afirmar que não existem direitos patrimoniais públicos que sejam disponíveis. Isso decorre do apego ao conhecido princípio da indisponibilidade do interesse público, explicado com maestria por Celso Antônio Bandeira de Mello, em seu Curso de Direito Administrativo (São Paulo: Malheiros, 2015, p. 76): “significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade — internos ao setor público — não se encontram à livre disposição de quem quer que seja por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los — o que é também um dever — na estrita conformidade do que dispuser a intentio legis”.
O interesse público é sempre indisponível pela administração pública, porque ele é de titularidade da coletividade, e não do poder público. A administração pública apenas o administra, protege e tem o dever de dar-lhe efetividade. Mas não pode dele dispor livremente porque não lhe pertence. Portanto, é correto afirmar que o interesse público é indisponível, mas isso não significa que todos os direitos patrimoniais, no âmbito do direito público, sejam indisponíveis. Por vezes, a disponibilidade de um patrimônio público pode ser de mais interesse da coletividade do que a sua preservação. A título de exemplo, cite-se o direito do contratado à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Aceita-se essa medida, porque é do interesse público garantir a continuidade dos contratos administrativos.
Há que se lembrar de que a Lei 8.666/93 admite os contratos de Direito Privado, implicitamente, no artigo 62, parágrafo 3º, I, ao mandar aplicar o disposto nos artigos 55 e 58 a 61 “aos contratos de seguro, de financiamento, de locação em que o poder público seja locatário, e aos demais cujo conteúdo seja regido predominantemente por norma de direito privado”. O compromisso arbitral tem natureza contratual, da mesma forma que a transação, conforme artigos 840 a 853 do Código Civil. Portanto, não há impedimento para que a administração pública participe de convenção de arbitragem, a qual se regerá pela legislação específica (Lei 9.307/96, alterada pela Lei 13.129/15), mas submetendo-se às normas da Lei 8.666/93, no que couber.
Como nem toda matéria pode ser objeto de decisão pela via da arbitragem — mas apenas os direitos patrimoniais disponíveis —, é importante que os instrumentos convocatórios de licitação e os contratos contenham cláusula prevendo a arbitragem e delimitando as matérias sobre as quais ela é possível. O fato de ser inserida a cláusula de arbitragem nos contratos administrativos não significa que ela possa referir-se a todas as matérias de que trata o contrato, porque algumas podem se referir a direitos patrimoniais indisponíveis.
Os contratos administrativos contêm cláusulas regulamentares e cláusulas financeiras. As primeiras referem-se ao próprio objeto do contrato, à forma de sua execução; elas decorrem do poder regulador da administração pública; são fixadas e alteradas unilateralmente pelo poder público. Mas as cláusulas financeiras, que dizem respeito à remuneração do contratado e ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato têm natureza tipicamente contratual. Por isso mesmo, não podem ser alteradas unilateralmente pelo poder público, mas podem ser objeto de acordo entre as partes.
Também não teria sentido a instalação de um procedimento de arbitragem para decisão de conflito que envolva prerrogativas de autoridade que só o poder público pode exercer. Não pode um tribunal de arbitragem decidir sobre as prerrogativas do artigo 58 da Lei 8.666 (alteração unilateral, rescisão unilateral, aplicação de penalidade etc). Mas pode decidir sobre os efeitos patrimoniais decorrentes do uso de prerrogativas próprias do poder público, como as de alterar e rescindir unilateralmente os contratos, que podem provocar o desequilíbrio econômico-financeiro. São aspectos que se incluem no conceito de direitos patrimoniais disponíveis, não porque a administração pública possa abrir mão de seus direitos, mas porque se trata de direitos passíveis de valoração econômica.
Visto o mesmo argumento sob outro ângulo, pode-se partir da distinção entre atos de império e atos de gestão. Os primeiros são praticados pelo poder público como autoridade, como ente que atua em nome do Estado. As decisões sobre desapropriação, tombamento, servidão administrativa, por exemplo, não podem ser objeto de apreciação por árbitro, mas os efeitos patrimoniais dessas decisões podem, porque são passíveis de valoração econômica. Já os atos de gestão são praticados pelo poder público sem as prerrogativas próprias de autoridade, tal como ocorre com os contratos de direito privado celebrados pela administração pública, como compra e venda, locação, permuta etc. Os conflitos surgidos podem ser decididos pela via da arbitragem.
Os acordos feitos pela administração pública, como o compromisso e a transação, não são novidade no Direito positivo. Desde longa data é prevista para os processos judiciais a possibilidade de a administração pública confessar, desistir, fazer transação, firmar compromissos, sem que se alegue qualquer óbice de natureza jurídica. A exigência que a lei faz é que tais atos sejam autorizados por determinadas autoridades. Não é qualquer advogado público que, por sua própria decisão, pode confessar, desistir, fazer transação, no curso de um processo judicial em que atua como representante do Estado.
A Lei da Advocacia-Geral da União (Lei Complementar 73, de 10.2.93) outorga ao advogado-geral da União a competência para “desistir, transigir, acordar e firmar compromisso nas ações de interesse da União, nos termos da legislação vigente” (artigo 4º, inciso VI). Esse dispositivo está regulamentado pela Lei 9.469, de 10.7.97, que estabelece as hipóteses em que o advogado-geral da União pode dispensar a inscrição de crédito, autorizar o não ajuizamento de ações e a não interposição de recursos, assim como o requerimento de extinção de ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos da União e das autarquias e fundações públicas federais (artigo 1º). O artigo 1º-B outorga igual autorização aos dirigentes máximos das empresas públicas federais até o limite de R$ 10 mil. Acima desse valor, a competência é do ministro de Estado ou do titular da Secretaria da Presidência da República a cuja área de competência estiver afeto o assunto. Se for empresa pública não dependente, basta a autorização do dirigente da empresa.
As leis orgânicas das Procuradorias dos estados e municípios costumam conter normas semelhantes.
Ora, não fazer a inscrição de crédito, desistir dos recursos, transigir, são medidas que implicam em abrir mão de direitos patrimoniais de natureza pública. Isso é muito mais do que permitir que terceiros — os árbitros — decidam sobre os direitos patrimoniais disponíveis. A única exigência diz respeito à competência para a decisão, que envolve aspecto de mérito, de apreciação do interesse público em jogo e que, por isso mesmo, é atribuída à determinada autoridade indicada na lei.
A Lei 13.129/15 inclui um parágrafo 2º no artigo 1º da Lei 9.307/96 estabelecendo que a “autoridade ou órgão competente da administração pública direta para a celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações”. O dispositivo causa certa perplexidade, porque não diz a que tipo de “acordo” se refere. Na esfera administrativa, não há previsão legal de competência para fazer transação. Esta é prevista no artigo 840 do Código Civil como modalidade de contrato. O dispositivo determina que “é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas”.
Diante disso, é possível afirmar, por analogia, que a autoridade que celebra a convenção de arbitragem tem que ser autorizada pelo advogado-geral da União ou pelas autoridades indicadas nas leis estaduais e municipais. Se na via judicial essa é a autoridade competente, do mesmo modo ocorrerá se o litígio for submetido a juízo arbitral. Até com mais razão, por se tratar de modo amigável de solução de disputas. Trata-se de aplicação do velho brocardo jurídico: “Ubi eadem est ratio, eadem est jus dispositivo” (Onde existe o mesmo fundamento, aplica-se a mesma regra jurídica).
Seria irrazoável atribuir a todas as autoridades competentes para firmar contratos administrativos o poder de decidir sobre a submissão, ao juízo arbitral, dos litígios envolvendo a administração pública.
Por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, advogada e professora titular aposentada de Direito Administrativo da Universidade de São Paulo (USP).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 24 de setembro de 2015, 8h00

Congresso Nacional mantém vetos à reforma da Lei de Arbitragem

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Em sessão que avançou durante a madrugada, o Congresso Nacional decidiu manter os vetos feitos na reforma da Lei de Arbitragem pela Presidência da República. Ao sancionar o texto, o vice-presidente da República, Michel Temer, no exercício da Presidência, vetou três dispositivos: a previsão da arbitragem para causas trabalhistas, para relações de consumo e para litígios relacionados a contratos de adesão.
A derrubada de qualquer veto da Presidência da República exige apoio de pelo menos 41 senadores e 257 deputados. No caso da lei de arbitragem, os três vetos receberam dos senadores 58 votos pela manutenção e apenas 10 pela derrubada. Como o mínimo de votos no Senado para a derrubada não foi atingido, os vetos sequer foram analisados pelos deputados.
Os vetos foram criticados por especialistas ouvidos pela ConJur. “Os vetos impedem a evolução plena da lei e a sua entrada definitiva no século XXI”, afirmou Marcelo Nobre, um dos membros da comissão de juristas que elaborou o anteprojeto. No entanto, a reforma da lei, mesmo com os vetos foi comemorada.
A proposta original foi elaborada por uma comissão de juristas, presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, e consolida práticas já reconhecidas pelos tribunais brasileiros.
Razão dos vetos
O novo texto adicionava três parágrafos ao artigo 4º da Lei de Arbitragem. O dispositivo define o que é a cláusula compromissória – mecanismo por meio do qual se insere num contrato a previsão de arbitragem para discutir determinados litígios. E a nova lei dizia que essa cláusula podia ser inserida em contratos de trabalho e em contratos de adesão relacionados a consumo.
Havia ressalvas. No caso trabalhista, a cláusula só poderia ser inserida por iniciativa do trabalhador e só era permitida em casos de cargo de confiança ou de executivos. No caso dos contratos de adesão, teria de ser por iniciativa do consumidor ou mediante expressa autorização dele.
Os três parágrafos foram vetados. No caso dos contratos de adesão, o veto foi a pedido do Ministério da Justiça. Na mensagem de veto, a pasta afirmou que os dispositivos autorizam a arbitragem “de forma ampla” sem deixar claro que o consumidor pode pedir a instauração de juízo arbitral também no decorrer do contrato, e não apenas no momento de sua assinatura. “Em decorrência das garantias próprias do direito do consumidor, tal ampliação do espaço da arbitragem, sem os devidos recortes, poderia significar um retrocesso e ofensa ao princípio norteador de proteção do consumidor”, diz o MJ.
Já o veto ao caso trabalhista veio do Ministério do Trabalho. Diz a pasta que, ao afirmar que só executivos ou ocupantes de cargos de direção podem ir para arbitragem para resolver seus conflitos trabalhistas, a lei “acabaria por realizar uma distinção indesejada entre empregados”.
O Ministério também afirma que a lei usava de “termo não definido tecnicamente na legislação trabalhista”, o que “colocaria em risco a generalidade de trabalhadores que poderiam se ver submetidos ao processo arbitral”.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 23 de setembro de 2015, 13h42

Relações de trabalho não seguem avanço da mediação e arbitragem

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A verdadeira democracia exige a participação social ampla e efetiva, não mais se admitindo a sua limitação à escolha periódica de governantes, nem à tomada de decisões na esfera estritamente política.
Desse modo, cabe à sociedade civil assumir seu verdadeiro papel nos rumos do desenvolvimento nacional, sem depender da interferência e da tutela estatais para todas e quaisquer questões. É certo que os conflitos são inerentes à dialética da vida em sociedade, bem como ao pluralismo de ideias e de interesses, mas a sua perpetuação não favorece a paz e a harmonia sociais.
Sendo assim, a pacificação das controvérsias, no contexto da democracia substancial, somente deve ficar na dependência do Estado quando os meios consensuais e estabelecidos pela própria sociedade organizada forem verdadeiramente incompatíveis, inadequados ou inviáveis.
Em outras palavras, a jurisdição, embora seja atividade, função e poder imprescindíveis ao bem comum, não pode mais ser vista como a forma predominante de pacificação dos conflitos. Isso fica nítido na recente evolução legislativa, que tem avançado na instituição e no incentivo de formas alternativas de solução de controvérsias, com destaque à conciliação, à mediação e à arbitragem, como se observa no Código de Processo Civil de 2015.
Nesse contexto, a Lei 13.140, de 26 de junho 2015, dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos na administração pública. A Lei 13.129, de 26 de maio de 2015, por sua vez, amplia o âmbito de aplicação da arbitragem na pacificação dos conflitos.
Esse movimento decorre do grau de maturidade alcançado pela sociedade, inserida no atual contexto democrático, o que a torna apta a instituir e manter mecanismos próprios e legítimos de pacificação, reservando ao Estado apenas os casos peculiares e de maior complexidade, que justifiquem a instauração de processo formal e a imposição de decisão judicial.
Afinal, ninguém melhor do que os próprios interessados, ainda que com o auxílio de mediador ou de conciliador, para estabelecer a justa solução de suas controvérsias, conhecedoras das especificidades das relações jurídicas envolvidas. Mesmo na arbitragem, embora a decisão seja proferida por um terceiro, ou seja, pelo árbitro, a sua previsão contratual ou a sua instauração decorrem de convenção das partes.
Não obstante, essa mesma evolução quanto aos mecanismos não jurisdicionais de pacificação dos conflitos não tem sido acompanhada no âmbito das relações de trabalho.
O que se observa na realidade brasileira é não só a manutenção, mas o crescimento da interferência estatal na resolução das controvérsias trabalhistas, ainda dependendo, cada vez mais, da imposição de tutela judicial.
A recente Lei 13.140/2015, na redação aprovada e sancionada, não é aplicável à esfera trabalhista, pois prevê que a mediação nas relações de trabalho deve ser regulada por lei própria (art. 42, parágrafo único), ainda inexistente.
O novo Código de Processo Civil, embora seja aplicável de forma supletiva e subsidiária ao processo do trabalho (art. 15), ao versar sobre os conciliadores, os mediadores e as câmaras privadas de conciliação e mediação, determina a sua inscrição em cadastro nacional e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal, sem fazer menção, ao menos expressamente, aos tribunais do trabalho.
Mesmo quanto à arbitragem, a jurisprudência tem entendido ser incompatível com os conflitos individuais de trabalho, pois os direitos seriam essencialmente indisponíveis. Apesar de ser expressamente admitida para a solução de conflitos coletivos, a arbitragem ainda é raramente utilizada pelos sujeitos envolvidos.
O Congresso Nacional havia aprovado dispositivo que permitia a arbitragem nos contratos individuais de trabalho de administradores e de diretores estatutários, com diversas exigências para se preservar a liberdade e a higidez da manifestação de vontade do empregado (PLS 406/2013 e PLC 7.108/2014). Essa previsão, entretanto, foi vetada.
Chegou o momento de a organização social, também no âmbito das relações envolvendo capital e trabalho, ter vida própria e autônoma, alcançando a pacificação dos seus conflitos sem depender, sempre, da tutela estatal, a qual deve incidir apenas de forma subsidiária.
É preciso se conscientizar do ensinamento universal, firmado na Encíclica Centesimus Annus, de que “uma sociedade de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade de ordem inferior, privando-a das suas competências”, mas sim apoiá-la quando necessário e ajudá-la a coordenar a sua ação, objetivando o bem comum (João Paulo II, 1991, n. 48).
Há amplo espaço, assim, para a atuação legítima e democrática da sociedade civil, das organizações sindicais, das associações profissionais e dos representantes de trabalhadores nas empresas, em benefício da paz social.
Por Gustavo Filipe Barbosa Garcia, livre-docente pela Faculdade de Direito da USP e professor titular do centro universitário UDF. É pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho. Foi juiz do Trabalho e procurador do Trabalho.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de setembro de 2015, 11h16

Ação anulatória de sentença parcial arbitral deve ser proposta em 90 dias

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A 3ª turma do STJ, em decisão unânime e seguindo o voto do ministro Marco Aurélio Bellizze, fixou importantes entendimentos envolvendo o instituto da arbitragem, no âmbito do prazo decadencial para anular sentença arbitral parcial e na admissão de empresa como litisconsorte. A demanda trata de repasse efetuado pela Copergás à Termopernambuco do custo do ICMS incidente na operação de fornecimento de gás natural da Petrobras à Copergás (Repasse ICMS downstream).
O relator, ministro Bellizze, concluiu que ação anulatória de sentença parcial arbitral “deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão tornar-se imutável”. O relator destacou o fato de que a lei de arbitragem estabelece o prazo decadencial de 90 dias para anular sentença arbitral, prazo este que se aplica à decisão parcial e à definitiva, “indistintamente”.
Também restou consignado pelo colegiado, conforme voto do ministro, que a conexão entre contratos celebrados não subtrai a autonomia e individualidade da relação jurídica de cada contrato, com partes e objetos próprios. E, sendo assim, no caso concreto, não restou caracterizado que a Petrobras deveria integrar o âmbito da arbitragem.
Prazo
O ministro Marco Aurélio Bellizze ressaltou inicialmente que, nos termos da lei de arbitragem, antes mesmo das alterações promovidas pela reforma (lei 13.129/15), não há óbice à prolação de sentença arbitral parcial.
Sendo assim, não subsistiria “qualquer argumento idôneo a autorizar a compreensão de que a impugnação ao comando da sentença parcial arbitral, por meio da competente ação anulatória, poderia ser engendrada somente por ocasião da prolação da sentença arbitral final”.
“Tal incumbência decorre da própria lei de regência (Lei n. 9.307/96, inclusive antes das alterações promovidas pela Lei n. 13.129/2015), que, no § 1º de seu art. 33, estabelece o prazo decadencial de 90 (noventa dias) para anular a sentença arbitral. Compreendendo-se sentença arbitral como gênero, do qual a parcial e a definitiva são espécies, o prazo previsto no aludido dispositivo legal aplica-se a estas, indistintamente. E, segundo restou devidamente consignado no acórdão recorrido, a possibilidade de julgamento fatiado, por meio do proferimento de sentença parcial, foi expressamente admitido pelas partes, a partir do Regulamento de Arbitragem da UNCITRAL por elas eleito.” (grifos nossos)
Autonomia e individualidade
Acerca da admissão da Petrobrás no referido procedimento, o ministro Bellizze ponderou:
“O objeto da ação promovida pela Termopernambuco em face da Copergás, perante o Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem, consiste em saber se a Copergás, ao proceder ao aludido repasse de valores por ocasião da revenda do gás natural à Termopernambuco, infringiu ou não a cláusula que estipulou o preço no contrato entre elas estabelecido (GSA downstream), para a aquisição de gás natural. O “preço” nada mais é do que a própria obrigação contratual assumida pela Termopernambuco no âmbito do GSA downstream. Por consectário, a composição do preço pelo qual a Termopernambuco adquire gás natural da Copergás é matéria necessariamente disciplinada no mencionado ajuste (GSA downstream) e, por óbvio, enseja a vinculação somente das partes contratantes.” (grifos nossos)
Dessa forma, a partir da delimitação do objeto da contenda arbitral, concluiu o relator que o provimento de mérito na arbitragem “não teria o condão de repercutir diretamente na esfera jurídica da Petrobrás, que, é certo, não titulariza a relação jurídica representada pelo contrato GSA downstream”.
Nessa toada, seja pela fluência do prazo decadencial da ação anulatória, seja pela não conformação de litisconsórcio passivo necessário e unitário a ser integrado pela Petrobrás no âmbito da arbitragem, Marco Aurélio Bellizze reconheceu a validade da sentença arbitral definitiva no tocante à delimitação subjetiva da arbitragem, determinando a remessa dos autos ao TJ/RJ para prosseguir na análise dos fundamentos remanescentes, relacionados à sentença arbitral final.
Processo relacionado: REsp 1.519.041
Fonte: Migalhas, quinta-feira, 10 de setembro de 2015